As Constituições Brasileiras e os direitos das mulheres

Por Luisa Paciullo*

Dificilmente você conseguirá viver um dia inteiro sem se deparar com alguma notícia, situação ou questionamento que não esbarre no universo do Direito. Apesar de ser muito presente no nosso dia-a-dia, muitas pessoas desconhecem a importância que as leis, doutrinas, jurisprudências, costumes e etc. possuem para a construção e manutenção do nosso sistema democrático. Muitas vezes o desinteresse e o distanciamento são causados por complicações na linguagem e nos conceitos. No entanto, saber o básico nos torna cidadãos mais conscientes de nossos direitos e, com certeza, nos ajuda a desenvolver um papel de relevância na sociedade.

Com a ajuda de vocês, faremos deste espaço um ambiente para explorar um pouco do mundo do Direito, com foco nas minorias e, principalmente, nas mulheres. A proposta não é aprofundar nem esgotar os tema, mas esclarecer dúvidas sobre conceitos, explicar o linguajar jurídico, abordar qualquer projeto de lei, discussão ou assunto que envolva os direitos das mulheres ou qualquer outra minoria e, principalmente, tentar conscientizar os leitores, através de uma série de ferramentas, da importância de compreender direitos e aplicá-los em nossas relações cotidianas.

Para um texto de boas-vindas, vou trazer uma breve pincelada de história da Constituição Brasileira e a representatividade das mulheres ao longo desses anos de Constituição. O Brasil já passou por outras 7 constituições antes da atual Constituição da República promulgada em 1988. Os textos das magnas cartas brasileiras, todos confeccionados por homens, contribuiu para a construção de um Estado patriarcal no qual as mulheres tiveram – e ainda têm – de lutar para verem seus direitos tutelados na lei mais importante do nosso sistema democrático, a Constituição.

Das 7 constituições, 4 foram promulgadas por Assembleias Constituintes. A Assembleia Constituinte é um órgão temporário constituído exclusivamente para o fim de criação de uma nova Carta Magna e seus participantes são eleitos pelo povo. A participação feminina nas Constituições da nossa história foi muito fraca. A Constituição de 1934, que trouxe em seu texto o direito elementar do exercício da cidadania, que é o de votar e ser votada, contou com apenas 1 mulher eleita – Carlota Pereira de Queirós – ao meio de 214 homens deputados.

Depois de 1934, foi só na Assembleia Constituinte de 1987 que as mulheres tiveram a melhor representação: 26 deputadas eleitas para a “Bancada feminina” em um universo de 559 congressistas. Ainda assim, questiona-se a falta de ligação destas deputadas com os movimentos feministas e suas bandeiras.

Sem aprofundar muito o tema sobre o perfil destas mulheres e o contexto histórico do momento, fato é que essa pequena participação foi importantíssima para um passo na proteção e efetivação dos direitos das mulheres. Um dos artigos mais importantes da Constituição, o artigo 5º, foi alterado para constar expressamente que todos são iguais perante a lei e que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Isso não significa que pessoas colocadas em situações diferentes devam ser tratadas de maneira igual, mas ao contrário: tratar com isonomia significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Os tratamentos normativos diferenciados são necessários quando existe uma finalidade razoável para atingir ao fim almejado. Temos como exemplo a proibição da diferença dos salários (art. 7º, inciso XXX), o incentivo ao trabalho da mulher, com normas protetoras (art. 7º, XX), aumento da licença-maternidade e etc.

Pela primeira vez, a constituição se preocupou com a violência doméstica, deixando expresso no artigo 226 a obrigação do Estado em prestar assistência e criar mecanismos a fim de coibir a violência no âmbito familiar e o marido deixou de ser o “chefe da família”: isso revogou diversos dispositivos extremamente conservadores do anterior Código Civil que determinava que a mulher perdia sua capacidade para a vida civil ao casar-se, transferindo todos os poderes ao homem.

A conquista de ver direitos protegidos por lei não garante sua efetividade, mas a existência de instrumentos jurídicos é essencial para fortalecer a luta por eles. Apesar de a Constituição de 1988 ser considerada um marco na proteção de direitos, ainda temos que buscar, e muito, pela efetivação desses direitos para vivermos em uma sociedade mais igualitária.

Gostou do texto? Mande sugestões, dúvidas ou temas que acharem pertinentes, mas que sejam relacionados ao universo da mulher para usarmos no próximo texto!

Fontes:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/assembleia-nacional-constituinte-de-1987-88
https://www.conjur.com.br/2010-nov-05/constituicao-1988-marco-discriminacao-familia-contemporanea
https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos30-37/Constituicao1934/ParticipacaoFeminina
https://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/constituicoes-brasileiras

Luisa é formada em jornalismo, hoje é advogada de profissão e cozinheira de paixão.
@lupaciullo